quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Tempos de medo na Cidade Maravilha


Quando tinha onze anos, pegava ônibus sozinha, ia para o colégio, para o curso de inglês, para o vôlei no Fluminense (por mais absurdo que possa parecer, eu jogava vôlei...). Era uma adolescente cheia de atividades. Depois do vôlei, do qual fui cortada pelo técnico por motivos óbvios (não adianta que não revelo minha altura), veio o teatro, o grêmio estudantil, a UBES. E aos dezesseis, veio a filiação ao partido e a uma de suas correntes.
Hoje já não tenho mais a utopia juvenil e na época dos caras-pintada-fora-collor eu já estava em outra há muito tempo...

Não existia MSN, Orkut, blog, celular. Na minha época, a gente ia pra rua, olhava nos olhos e escrevia confidências na agenda. A gente não ouvia funk, nem Belo, mas dançava de um jeito meio esquisito ao som da Legião, Gang 90, Blitz, Paralamas, Camisa de Vênus. Lembro das roupas coloridas, das calças da Company e das mochilas emborrachadas. Lembro das cores, dos sabores e é como se pudesse fechar os olhos e sentir o cheiro daquele tempo.

Minha geração foi atropelada por várias mudanças. Teve que aprender a enviar torpedos pelo celular e a usar camisinhas para transar. Teve que se adaptar às tecnologias, encaixotar os discos e enviar e-mails.

Hoje, minha geração vive olhando pros lados. Não como a geração dos meus pais que liam e queimavam o que liam. Que perdiam amigos que nunca voltaram. Que temiam viver para sempre numa sociedade subtraída. Minha geração não tem ideais sociais, embora seja crescente a preocupação ambiental. Minha geração é individualista, é consumista e sem tempo para olhar nos olhos.

Mas estamos olhando para os lados, vivendo com medo... De nossas casas ouvimos os helicópteros, os tiros e as constantes queimas de fogos. De nossas casas assistimos ao noticiário na tv a cabo e vemos as vítimas, os ônibus queimados, os discursos. Não temos medo só de avião, mas andamos de ônibus com medo. Andamos de carro com medo. Mantemos nossos filhos em casa na frente do computador por medo...

Somos reféns de que? De quem? Do tráfico? Da polícia? Da falta de política de segurança pública? Somos reféns daquele baseado "inofensivo"? Da pressa? Da deseperança? De que? De quem?

Preferia o tempo do Herbert Viana usando óculos e cantando as meninas do Leblon.

O Calibre

Os Paralamas do Sucesso

Composição: Herbert Viana

Eu vivo sem saber até quando ainda estou vivo
Sem saber o calibre do perigo
Eu não sei da onde vem o tiro (2x)

Por que caminhos você vai e volta?
Aonde você nunca vai?
Em que esquinas você nunca pára?
A que horas você nunca sai?
Há quanto tempo você sente medo?
Quantos amigos você já perdeu?
Entricherado, vivendo em segredo
E ainda diz que não é problema seu

E a vida já não é mais vida
No caos ninguém é cidadão
As promessas foram esquecidas
Não há estado, não há mais nação
Perdido em números de guerra
Rezando por dias de paz
Não vê que a sua vida aqui se encerra
Com uma nota curta nos jornais

Eu vivo sem saber até quando ainda estou vivo
Sem saber o calibre do perigo
Eu não sei, daonde vem o tiro (2x)